Nos capítulos 3 a 7 da Epístola aos Hebreus (que estamos lendo há duas edições do Jornal da Arquidiocese), o apóstolo Paulo medita sobre a fidelidade e a misericórdia do sumo sacerdote Jesus. Tomando por exemplo o episódio do Êxodo, a saída da escravidão do povo hebreu guiado por Moisés, o autor apresenta Jesus também como guia e mediador do povo de Deus, porém de forma mais excelente, pois Jesus é Filho de Deus. O êxodo pelo deserto, ocasião de forte experiência de fé, de provações, de perseverança, mas também de murmúrios e infidelidades à Aliança, serve de exemplo para quem deseja entrar no “repouso”, isto é, na vida eterna com Deus. O sacerdote, cuja missão é oferecer sacrifícios de sangue de animais em favor de si e do povo a Deus, serve de exemplo para mostrar que Jesus, ao se fazer vítima no altar da cruz, agiu como sacerdote (de fato, nos Evangelhos Jesus afirma que ninguém tira a sua vida, mas Ele a oferece livremente, cf Jo 10,18), derramando o seu próprio sangue, em favor do povo, ao seu Pai. Sendo Filho de Deus, Jesus é o sacerdote e a vítima sacrificial por excelência, não necessitando, em razão disso, que tal ato seja repetido, pois é único, insuperável e definitivo. O seu sacerdócio supera igualmente o sacerdócio levítico, pois é segundo a “ordem de Melquisedec”, figura emblemática do Antigo Testamento (cf. Gn 14,18), “rei e sacerdote do Deus altíssimo”, cuja origem e destino não são descritos, e que serve de modelo para indicar o sacerdócio eterno de Cristo (cf. Sl 109,4, que atesta que o sacerdócio do Messias seria segundo “a ordem de Melquisedec”). A conclusão dessa reflexão é esboçada nos capítulos de 8 a 10, onde o autor manifesta a ineficácia e a superação dos sacrifícios antigos ante o inigualável sacrifício de Cristo.
A parte final da carta, nos capítulos 11 e 12, encontramos um enfático convite para nos aproximarmos, com fé, esperança, perseverança, da fonte de graça, e evitarmos todo perigo de apostasia. A fé, “garantia dos bens que se esperam, a prova das realidades que não se veem” (11,1), encontra exemplo nos patriarcas e matriarcas do povo e da fé, que com suas vidas marcadas por tantos desafios, não deixaram de caminhar em busca dos bens futuros que, para Paulo, foram concedidos com a vinda de Cristo.
A carta aos Hebreus é uma bela reflexão sobre a obra salvadora de Cristo, preparada, prometida e esperada nos tempos passados, na vida de tantos homens e mulheres que seguiram na fé a Palavra de Deus. Ao fazer-se carne, assumindo misericordiosamente a condição humana pecadora, mesmo não sendo pecador, realizou e cumpriu todas as promessas quando se ofereceu na cruz, livremente, como sacrifício de redenção. Assim, reconhecemos que, em Cristo, encontramos um pontífice que nos conduz à total comunhão com Deus, seu Pai”.
Por Pe. Gilson Meurer
Artigo publicado na edição de dezembro de 2020 do Jornal da Arquidiocese, página 8.