O Programa Arquidiocesano de Tutela de Menores e Pessoas Vulneráveis da Arquidiocese de Florianópolis, ou simplesmente denominado Programa Arquidiocesano de Tutela, à luz da Carta Apostólica do Papa Francisco, em forma de motu proprio Vos Estis Lux Mundi (VELM), é um conjunto de procedimentos voltados para a prevenção e enfrentamento de situações de abuso ou exploração sexual contra menor de dezoito (18) anos ou adulto vulnerável.

Nas últimas décadas, os meios de comunicação têm revelado uma crise de proporções gigantescas no âmbito da Igreja. Por todo o mundo explodem notícias de escândalos de clérigos e membros dos Institutos de Vida Consagrada e Sociedade de Vida Apostólica (IVC e SVA) que abusaram de crianças ou pessoas vulneráveis.

O ensinamento sólido e a ação firme dos últimos papas exigem que a Igreja se torne cada vez mais inflexível na condenação desses crimes e na proteção das vítimas. Na base de tudo está a reluzente palavra do Senhor: “Quem provocar a queda de um só destes pequenos que creem em mim, melhor seria que lhe amarrassem ao pescoço uma pedra de moinho e o lançassem ao mar. Ai do mundo por causa dos escândalos” (Mt 18,6-7). E mais à frente, na parábola do julgamento final: “Todas as vezes que fizestes isso a um destes pequenos, que são meus irmãos, foi a mim que o fizestes” (Mt 25,40). Se o Senhor quis fazer-se presente e ser amado em cada ser humano, que foi criado à imagem e semelhança de Deus (Gn 1,16), muito mais evidente é sua presença nos menores e pessoas vulneráveis que, em sua singeleza, depositam plena confiança nos líderes da Igreja. O crime por estes cometido torna-se, assim, traição ao próprio Cristo.

No enfrentamento dessa realidade, diversas atitudes foram tomadas pelo Papa Francisco. Três delas podem ser destacadas. Em dezembro de 2013, instituiu a Pontifícia Comissão para a Tutela dos Menores, que nasceu com a missão de propor iniciativas para proteger os menores e os adultos vulneráveis, garantir que esses tipos de crime não sejam mais repetidos na Igreja. E convocou para fevereiro de 2019, um encontro com todos os presidentes das Conferências Episcopais para tratar da proteção dos menores e adultos vulneráveis. Na abertura desse encontro, o papa assim se expressou: “Sobre o nosso encontro, grava o peso da responsabilidade pastoral e eclesial que nos obriga a dialogar conjuntamente, de forma sinodal, sincera e profunda sobre o modo como enfrentar este mal que aflige a Igreja e a humanidade. O santo Povo de Deus olha para nós e espera de nós, não meras e óbvias condenações, mas medidas concretas e eficazes a implementar. Requer-se concretização. Comecemos, pois, o nosso percurso, armados com a fé e o espírito de máxima franqueza (parresia), coragem e concretização”. Em maio do mesmo ano, promulgou a Carta Apostólica sob forma de motu proprio “Vos Estis Lux Mundi” (VELM), que contém as novas medidas que toda a Igreja deve adotar para prevenir e combater os abusos sexuais cometidos por seus membros contra menores de idade e pessoas vulneráveis.

Em comunhão com o Papa Francisco e com toda a Igreja, a Arquidiocese de Florianópolis “reafirma sua adesão incondicional à postura de tolerância zero em relação aos casos de abuso sexual contra menores, segundo o que o Papa Francisco tem afirmado: ‘não há lugar, no ministério da Igreja, para aqueles que cometem abusos sexuais; e me empenho a não tolerar o dano causado a um menor por parte de quem quer que seja, independentemente do seu estado clerical (Homilia, 7 de julho de 2014)’” (CNBB, O cuidado pastoral das vítimas de abuso sexual. Brasília: Edições CNBB, 2019, p. 5).

A Arquidiocese de Florianópolis, por isso:

  • Rejeita a violência, em todas as suas manifestações, particularmente contra menores e adultos vulneráveis;
  • Protegerá os direitos e a dignidade de cada pessoa, afastando qualquer possibilidade de cometer injustiça, seja contra a vítima, seja contra clérigo, membro dos IVC ou SVA, agente de pastoral ou colaborador falsamente denunciado;
  • Abraça a justiça, como expressão de misericórdia, sabendo que a “misericórdia e fidelidade se encontram, justiça e paz se abraçam” (Sl 85[84],11);
  • Pede perdão humildemente diante dos pecados graves e crimes já cometidos;
  • Envidará todos os esforços para amparar, proteger e cuidar pastoralmente de todos os que tenham sofrido abusos, tendo consciência das implicações teológicas, psicológicas, sociológicas e jurídicas;
  • Responderá a cada denúncia de abuso contra o clero ou agentes de pastoral, seguindo as normativas da Igreja e os procedimentos delineados neste guia;
  • Intensificará, no processo formativo, tanto dos clérigos e dos membros dos IVC ou SVA quanto dos leigos, uma preparação mais qualificada para o cuidado pastoral das crianças e adolescentes;
  • E estará a serviço da verdade, da justiça e da vida, por meio do Programa Arquidiocesano de Tutela de Menores e Pessoas Vulneráveis.

Este programa é um instrumento para uso interno da Arquidiocese Florianópolis e formaliza os procedimentos a serem adotados em caso de denúncia de abuso sexual contra menores e adultos vulneráveis. Responde às determinações do Papa Francisco de que seja implantado um programa estável e de fácil acesso ao público para apresentar as assinalações, inclusive por meio da instituição de uma peculiar repartição eclesiástica (cf. VELM, Art. 2, § 1).

Artigo 1º. O Programa Arquidiocesano de Tutela de Menores e Pessoas Vulneráveis da Arquidiocese de Florianópolis, ou simplesmente denominado Programa Arquidiocesano de Tutela, à luz da Carta Apostólica do Papa Francisco, em forma de motu proprio Vos Estis Lux Mundi (VELM), é um conjunto de procedimentos voltados para a prevenção e enfrentamento de situações de abuso ou exploração sexual contra menor de dezoito (18) anos ou adulto vulnerável, que abarcam as seguintes ações concretas e eficazes:
I – Criação da Comissão Arquidiocesana de Tutela;
II – Ouvidoria;
III – Investigação Prévia;
IV – Serviços de Acolhimento e de Comunicação;
V – Recomendações de Conduta e Prevenção.

Artigo 2º. Para efeitos deste Programa Arquidiocesano de Tutela, serão tratados somente delitos que atentem contra o sexto mandamento, praticados por clérigos e membros dos Institutos de Vida Consagrada e das Sociedades de Vida Apostólica (IVC ou SVA), na Arquidiocese de Florianópolis, contra menores de 18 anos ou pessoas vulneráveis, consistindo nas seguintes condutas (cf. VELM, Art.1, § 1, a):
I – Forçar alguém, com violência, ameaça ou abuso de autoridade, a realizar ou sofrer atos sexuais;
II – Realizar atos sexuais com menor ou com pessoa vulnerável, ainda que com seu consentimento;
III – Produzir, exibir, possuir ou distribuir, inclusive por via telemática, material pornográfico infantil, bem como no recrutar ou induzir menor ou pessoa vulnerável a participar em exibições pornográficas.
Parágrafo Único – Tendo presente que no Direito Penal Canônico um dos foros de competência é justamente o do lugar onde o delito ocorreu (Cân. 1412), prescindindo do fato de o clérigo ou o membro dos IVC ou SVA pertencer ou não à Arquidiocese, havendo denúncia, o Ordinário local deverá agir da mesma forma, cabendo-lhe tomar as medidas iniciais, entre elas, comunicar ao Ordinário próprio do clérigo ou membro do IVC ou SVA a referida denúncia.

Artigo 3º. São também considerados delitos, sujeitos a este Programa, as seguintes condutas:
I – Ações ou omissões tendentes a interferir ou contornar as investigações do Estado ou as investigações da Igreja, administrativas ou criminais, contra um clérigo ou membro dos IVC ou SVA, relativas aos delitos a que se refere o artigo anterior (VELM, Art. 1, § 1, b);
II – Causar danos, retaliações ou discriminações contra alguém, pelo fato de ter feito uma denúncia, ressalvado o previsto no Cân. 1390 (cf. VELM, Art. 4, § 2).
Parágrafo Único – Estão fora da alçada deste Programa, assinalações contra bispos da Província Eclesiástica de Santa Catarina, que devem ser referidas diretamente à Santa Sé ou ao Arcebispo Metropolitano; e denúncias contra o Arcebispo Metropolitano, que devem ser feitas à Santa Sé ou ao bispo sufragâneo mais antigo por promoção (cf. VELM, Art. 8, § 1-2.).

Artigo 4º. Segundo as definições da Carta Apostólica Vos Estis Lux Mundi (cf. VELM, Art. 1, § 2.), considera-se:
I – Menor: toda a pessoa que tiver idade inferior a dezoito (18) anos ou a ela equiparada por lei, isto é, as pessoas que possuem habitualmente um uso imperfeito da razão. O conceito de “menor”, relativamente aos casos em questão, variou ao longo do tempo: até 30 de abril de 2001, entendia-se a pessoa com menos de 16 anos de idade. Desde 30 de abril de 2001, quando foi promulgado o motu proprio «Sacramentorum sanctitatis tutela», a idade foi universalmente elevada para 18 anos, sendo a idade ainda em vigor. É preciso ter em conta estas variações, quando se deve definir se o «menor» o era realmente, segundo a definição de Lei em vigor no momento dos fatos (cf. DDF, Vademecum, I, 3);
II – Pessoa Vulnerável: adulto que, pelo estado de enfermidade, deficiência física ou psíquica, ou de privação da liberdade, mesmo ocasionalmente, tenha limitada a sua capacidade de entender, querer ou de resistir à ofensa;
III – Material Pornográfico Infantil: qualquer representação de um menor, independentemente do meio utilizado, envolvido em atividades sexuais explícitas, reais ou simuladas e qualquer representação de órgãos sexuais de menores para fins predominantemente sexuais.

Artigo 5º. Para efeitos deste Programa Arquidiocesano de Tutela, considera-se ainda:
I – Familiares: consanguíneos em linha reta (avós, pais, filhos e netos) e colateral até o segundo grau (irmãos) e todos os que, de forma legítima (adoção, tutela e curatela), possuem responsabilidade direta sobre o menor ou pessoa vulnerável.
II – Colaboradores: empregados, voluntários, agentes de pastorais e movimentos e novas comunidades, seminaristas, terceirizados e todos que prestam serviços, mediante remuneração ou não, direta ou indiretamente, à Arquidiocese de Florianópolis, ou que atuem em nome desta;
III – Autoridades do Estado: Conselho Tutelar, Disque 100, Delegacia de Polícia, Juízo e Promotoria da Infância e Juventude, Polícia Militar, dentre outras;
IV – Legislação Civil: Constituição Federal, Código Civil, Código Penal, Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei Nº 8.069/1990), Lei Nº 13.431/2017; Decreto Nº 9.603/2018; Lei Nº 14.343/2022;
V – Legislação Eclesiástica: dentre outras normas e orientações pertinentes, Código de Direito Canônico (Cân. 1395, § 2); Carta Apostólica do Papa São João Paulo II, em forma de motu proprio Sacramentorum Sanctatis Tutela (SST – 30 de abril de 2011), com as subsequentes normas aplicativas emanadas pela Congregação para a Doutrina da Fé e a Carta Apostólica do Papa Francisco, em forma de motu proprio Vos Estis Lux Mundi (9 de maio de 2019); VADEMECUM sobre alguns pontos de procedimento para tratar os casos de abuso sexual de menores cometidos por clérigos, do Dicastério para a Doutrina da Fé, 2ª. Edição revisada, de 5 de junho de 2022. Outros documentos ou normativas emanados após a entrada em vigor deste Regulamento relativos aos casos de abuso sexual de menores e de pessoas vulneráveis.

Ouvidoria

A Ouvidoria, com seus diversos canais, é o meio pelo qual a Arquidiocese de Florianópolis recebe as assinalações sobre fatos, suspeitas ou circunstâncias que sugerem a presença de sérios indícios de práticas de abuso sexual contra menores ou pessoas vulneráveis, praticados no território da Arquidiocese de Florianópolis por clérigos e membros dos IVC ou SVA.

Adotam-se na Arquidiocese de Florianópolis os seguintes canais de Ouvidoria:

I – Site: formulário;
II – Correspondência: encaminhada somente por Carta Registrada com Aviso de Recebimento (AR), destinada à “COMISSÃO ARQUIDIOCESANA DE TUTELA”, no endereço Rua Esteves Júnior, 447 – Centro – CEP 88015-130 – Florianópolis – SC.
III – Atendimento Presencial: a ser realizado através de agendamento pelo telefone (48) 3224.4799 ou e-mail: [email protected], informando o assunto: “Abuso de Menor ou Pessoa Vulnerável”;
IV – E-mail: [email protected], informando o assunto: “Abuso de Menor ou Pessoa Vulnerável”.

Assinalações vagas, imprecisas ou incompletas, que impeçam a apuração dos fatos, dificilmente serão aceitas devido à dificuldade de uma avaliação mais precisa.

É vedada e repudiada qualquer assinalação dolosamente infundada, falsa, incompleta, ou que vise criar denuncismo, perseguição ou qualquer outra situação estranha à finalidade deste Programa.