Conhecendo o livro dos Salmos – 120, 121, 122 (119, 120 e 121) – Por Pe. Ney Brasil

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Conhecendo o livro dos Salmos – 120, 121, 122 (119, 120 e 121) – Por Pe. Ney Brasil
Todo mês, no Jornal da Arquidiocese, você confere a reflexão do Salmo pelo Pe. Ney Brasil Pereira.
Todo mês, no Jornal da Arquidiocese, você confere a reflexão do Salmo pelo Pe. Ney Brasil Pereira.

SALMOS 120, 121, 122– “DAS SUBIDAS

 

            Tendo meditado sobre o longo “Salmo da Lei”, constituído por vinte e duas estrofes com oito versículos cada uma, deparamo-nos agora com uma série de quinze salmos, quase todos bastante curtos, os de número 120 a 134, todos eles classificados como “cantos das subidas”, em hebraico, ou “cantos dos degraus”, em grego, ou “salmos graduais”, em latim. Há também outras denominações, como “cantos das romarias”, ou “cantos de peregrinação”.

            Talvez o mais característico desses salmos seja o de número 122, com o seu conhecido início: Alegrei-me quando me disseram: Vamos à casa do Senhor! Agora detêm-se nossos passos, às tuas portas, Jerusalém! (Sl 122,1-2). De Jerusalém contemplam-se os montes (Sls 121 e 125); olha-se para o céu (Sl 123); recorda-se o exílio e o retorno (Sls 120 e 126); recebe-se a bênção (Sls 127 e 128); segurança e confiança (Sls 129 e 131); tudo, pela presença do Senhor em seu Templo (Sl 132).

            Poderíamos também apresentar a sequência dos quinze salmos em ordem ascendente ou progressiva, com a sua temática: Sl 120, no desterro; Sl 121, à vista dos montes; Sl 122, em Jerusalém; Sl 123, olhando o Senhor; Sl 124, anseio de libertação; Sl 125, estabilidade; Sl 126, retorno do exílio; Sl 127, uma casa e família; Sl 128, a vida no lar; Sl 129, o inimigo rechaçado; Sl 130, a sentinela; Sl 131, confiança íntima; Sl 132, o Senhor em seu Templo; Sl 133, alegria da convivência; Sl 134, bênção final.

            Começaremos estudando os primeiros três salmos da série: o Sl 120(119), o Sl 121(120), e o Sl 122(121), sem esquecer o tema de fundo que os une, a “subida”. Subida para Jerusalém, subida para a “cidade permanente” (cf. Hb 13,14), subida para Deus.

 

SALMO 120(119): LONGE DA PÁTRIA

 

            Este salmo é uma súplica. Bastante simples em sua estrutura, o orante começa mencionando sua angústia e a imediata resposta do Senhor. A seguir, entra em detalhes sobre as calúnias que tem sofrido e sobre a situação aflitiva que atravessa, longe da pátria, em meio a gente que não quer saber de paz.

Livra-me, Senhor!

1.[Cântico das subidas] Na minha angústia, clamei ao Senhor, / e Ele

me respondeu.

  1. Senhor, livra minha vida / dos lábios mentirosos, da língua traidora.

O que aflige o salmista são as calúnias que ele está sofrendo, da parte de “lábios mentirosos e língua enganadora”. São conhecidas as advertências contra o poder destruidor da língua também em outros salmos e, no Novo Testamento, a severa e detalhada  advertência de Tiago em sua carta: Tg 3,1-13. Esse poder nefasto está na mentira, quer na vida social, nas relações comerciais, na corrupção, no falso testemunho. É sabido como pode ser trágico o efeito de uma calúnia.

O castigo da língua mentirosa

  1. Que se deverá dar-te, e como retribuir-te, / ó língua enganadora?
  2. Flechas agudas de um guerreiro, / com brasas de giesta.

Ciente do dano irreparável do caluniador, o salmista se pergunta como puni-lo adequadamente, interpelando-o, mas confiando a Deus o castigo. E sugere que o próprio Deus o atinja com “flechas agudas”, e com “brasas de giesta” ou zimbro, uma espécie de carvão vegetal resistente, que custa a se apagar.

No meio de estranhos

  1. Infeliz de mim! Sou estrangeiro em Mosoc, / moro entre as tendas de Cedar.

Mosoc, ou Mesec, é um povo de mercadores, mencionado em Ez 27,13 e 39,1, que viviam ao norte da Assíria, enquanto Cedar designa os beduínos, na Arábia. Como quer que seja, regiões muito distantes de Jerusalém

O conflito: guerra e paz

  1. Estou vivendo tempo demais / com gente que odeia a paz.
  2. Eu sou pela paz, / mas quando falo, eles são pela guerra.

O salmista se queixa do conflito que vive entre “gente que odeia a paz”. E revela sua impotência pessoal de fazer triunfar a paz – o bem mais desejável – no  meio de um povo que insiste na guerra. Não será este anseio pela paz, da parte do orante, a expressão do seu anseio pelo retorno a Jerusalém, a “cidade da paz”?

 

SALMO 121(120): INÍCIO DA ROMARIA

 

Depois da súplica angustiada do salmo anterior, este salmo é expressão de confiança e, ao mesmo tempo, exortação a confiar. Nos vv. 1-2 o orante pergunta, e logo responde a si mesmo: De onde? – Do Senhor! A seguir, do 3º versículo até o final, uma voz não identificada interpela o orante em segunda pessoa: será um levita ou  sacerdote, pronunciando um oráculo em contexto litúrgico? Ou será o próprio Deus, no íntimo do salmista?

De onde, o meu auxílio?

  1. [Cântico das subidas] Levanto os olhos para os montes: / de onde me

virá o auxílio?

            Pergunta fundamental, para quem não encontra socorro na terra. O olhar volta-se para cima, “para os montes”, num movimento ascensional até a atmosfera divina. Assim também procede o peregrino, subindo para Jerusalém.

Meu auxílio vem do Senhor!

  1. Meu auxílio vem do Senhor, / que fez o céu e a terra.

Das montanhas, sobe o espírito do salmista até Deus, que está “acima dos montes” e é o Criador do universo, “do céu e da terra”, segundo a profissão de fé do início do Gênesis: “No princípio, Deus criou o céu e a terra” (Gn 1,1). Este versículo do salmo é tão fundamental, que a liturgia o repete sempre, a cada fórmula de bênção: “O nosso auxílio está no nome do Senhor – que fez o céu e a terra!”

O Senhor é teu guarda

  1. Não deixará teu pé vacilar, / o teu guarda não dorme.
  2. Não dorme, nem cochila / o guarda de Israel.
  3. O Senhor é o teu guarda / o Senhor é como a sombra que te cobre, / e está

 à tua direita.

Como o orante do Sl 23 confia em Deus como seu “pastor”, e por isso “nada lhe falta”, assim a voz do oráculo convida a confiar em Deus como num “guarda” pessoal, um “guarda-costas”, que garante  absoluta segurança. Note-se como, nestes seis versículos finais do salmo repete-se insistentemente o verbo guardar (três vezes) e o substantivo guarda (também três vezes). Desse “guarda” se diz que ele “não dorme nem cochila”, que ele “não deixará teu pé vacilar”, que é “como a sombra que te cobre” e “está à tua direita”. Proteção total, portanto, daquele que é “o guarda  de Israel”!

Desde agora e para sempre

  1. De dia o sol não te fará mal, / nem a lua, de noite.
  2. O Senhor te guardará de todo mal, / guardará a tua vida.
  3. O Senhor vai te guardar na tua saída e na tua entrada / desde agora e para sempre.

Insistindo na proteção total que este “guarda” oferece e garante, a voz do oráculo multiplica as alternativas, ou seja, as polaridades que representam a oscilação da existência humana: sol e lua, dia e noite, entrada e saída, agora e sempre. A preservação “de todo mal” lembra o final do Pai-nosso: “Livra-nos do Maligno”. E durará “desde agora e para sempre”, transcendendo o tempo.

 

SALMO 122(121): VAMOS À CASA DO SENHOR!

 

            Este salmo é um cântico a Jerusalém, nome que, em etimologia popular, significa “cidade da paz”. Pelo tema, faz companhia aos salmos 46, 48 e 87. Tem duas partes: louvor à cidade, e petição por ela. Sua ambientação está explícita no início: peregrinos chegam à cidade, meta de sua viagem física e espiritual.

Alegria na partida, alegria na chegada

  1. [Cântico das subidas] Que alegria, quando me disseram: / Vamos

à casa do Senhor!

  1. E agora se detêm nossos passos / às tuas portas, Jerusalém!

O salmista concentra nestes dois versículos os dois elementos extremos da romaria: o anúncio da partida e, logo, saltando a fadiga da  viagem, a alegre chegada.

Beleza e completude da cidade capital

  1. Jerusalém está construída / como cidade sólida e compacta.
  2. É para lá que sobem as tribos, as tribos do Senhor, / segundo a lei de Israel,

 para louvar o nome do Senhor!

  1. Pois lá estão os tribunais de justiça, / os tribunais da casa de Davi.

Repetindo o nome da cidade, o salmista exalta-lhe a beleza urbana e a sua condição de centro cultual de todas as tribos. Exalta-lhe também a dignidade e o compromisso de administradora da justiça: lugar de culto, lugar também de justiça social, confiada à dinastia de Davi, figura do rei ideal segundo o Sl 72.

Paz para Jerusalém!

  1. Desejai a paz para Jerusalém; / vivam em paz os que te amam!
  2. Haja paz nos teus muros, / segurança nos teus palácios.
  3. Por amor a meus irmãos e meus amigos, / eu direi: Paz sobre ti!
  4. Por amor à casa do Senhor, nosso Deus, / te desejo todo o bem.

Impressiona, neste final do salmo, a multiplicação dos votos de “paz” (quatro vezes) , em hebr. shalôm, que significa não apenas ausência de guerra mas plenitude de bem-estar e felicidade, resumida no voto final de “todo o bem”. Os votos se estendem a todos “os que amam” Jerusalém, e são motivados pelo amor do salmista a seus “irmãos e amigos”, amor, finalmente, à “casa do Senhor”. O cumprimento pleno desses votos se encontra no final do Apocalipse, no esplendor da noiva do Cordeiro, a nova Jerusalém, que desce do céu (Ap 21,2 e 9-27).

Pe. Ney Brasil Pereira

Professor emérito de Exegese Bíblica da FACASC

Email: [email protected]

Para refletir: 1) Que entende você por “salmos das subidas?

                        2) O que aflige o orante do Sl 120? Qual o poder nefasto da mentira?

            3) De quem espera socorro o orante do Sl 121? Como o Senhor nos guarda?

            4) O que caracteriza o Sl 122, em seus dois primeiros versículos?

            5) Como o salmista do Sl 122 exalta Jerusalém, e como lhe exprime seus votos?

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