“Com um pão, um lápis, um caderno e um professor é possível construir o sonho de uma criança em Guiné Bissau”
“Eu quero fazer medicina, se há possibilidade. Espero com a vossa ajuda conseguir”. Esse é o sonho da jovem Marcângela. “Se não conseguirmos comer, não vamos aprender ou vamos assimilar pouco, porque se está com fome. Precisamos da construção de uma cantina aqui, onde todos os alunos vão se beneficiar, sobretudo os que vieram de longe. Essa é a necessidade de Brayam.
Marcângela, Brayam e tantos outros jovens e crianças da região de Empada, sul de Guiné Bissau, África Ocidental, trazem seus anseios, necessidades e expectativas de vida, nos quase 14 quilômetros que andam a pé para chegar até o colégio. Guiné Bissau tem um milhão e 600 mil habitantes. Já Empada é uma das áreas mais pobres e desfavorecidas do Continente Africano, onde se come uma vez por dia e com hora marcada, às 15h30.
Na periferia de Empada existem muitas escolas de base do interior que precisam de ajuda. Em cada carteira sentam quatro crianças, com apenas um caderno e um lápis. Uma média de 95 crianças e 25 cadernos e lápis. Como funciona? A primeira criança copia a frase do quadro, passa para o lado. A segunda criança copia e passa o caderno para outra. E assim elas fazem a aula inteira.
Diante desse cenário provavelmente é gerada uma inquietação. Porém, o leitor do Jornal da Arquidiocese de Florianópolis deve se perguntar: o que tem haver a África com a Igreja local? A resposta vem rápida. No ano de 2012, Pe. Vilson Groh viajou novamente para Guiné Bissau e trouxe no coração a inquietude de que precisava fazer alguma coisa para ajudar as pessoas daquela região.
A proposta então se materializou com a vinda do padre guineense, Maio da Silva, para Florianópolis. Ele recebeu da equipe executiva do Instituto Vilson Groh (IVG) formações intensas na área de elaboração, gerenciamento e gestão de projetos, sustentabilidade econômica e contexto territorial.
Padre Maio ficou três meses em Florianópolis. Nesse período identificou qual a demanda, dentre as muitas de seu país, seria prioritária para a construção de um projeto elaborado com os conhecimentos adquiridos nas formações que recebeu da equipe do IVG. Ele escolheu apoiar a educação, em um primeiro momento com foco na sustentabilidade financeira do Liceu (Colégio) Dom Settímio Arturo Ferrazzeta (7º ao 13º ano), em Empada. Buscava, assim, garantir condições para que os alunos sem recursos financeiros pudessem terminar os estudos.
No país, boa parte das escolas é de autogestão e os alunos precisam pagar para estudar. A mensalidade é como que uma ajuda de custo para os professores. “Nenhum professor quer sair da capital e ir para Empada, pois além de ser longe, os salários são baixos e sempre atrasam”, afirmou o gestor do projeto, Willian Narzetti. As escolas são geridas sob três eixos: o Estado, a comunidade e a missão religiosa. Somente através deste equilíbrio de forças é possível garantir a permanência dos professores que vem da capital Bissau.
Projeto de apoio à educação do IVG
Após identificar a demanda, elaborou-se o projeto, supervisionado pelo Instituto Vilson Groh. Em seguida, a proposta foi apresentada aos doadores, parceiros e padrinhos. “Este modelo é sustentável por estar estruturado em uma rede de muitos colaboradores, cada um apoiando com aquilo que pode. São apoiadores da Grande Florianópolis, Brusque e Curitiba”, disse Willian que também trabalha na parte de captação de recursos.
A coordenação dos Grupos Bíblicos em Família (GBF) tem registrado aproximadamente 40 grupos da Arquidiocese que amparam esta rede de educação em Empada. “Apoiamos o projeto porque acreditamos que aquele povo está esquecido, necessitado, e sabemos que está sendo feito um trabalho sério, sem busca de promoção”, comentou Norberto Cazagranda, um doador de Brusque.
Hoje, Pe. Maio é o gestor local do projeto desenvolvido pelo Instituto. Este ano, Pe. Vilson e Willian estiveram por 17 dias na África para averiguar o andamento do programa e perceber os frutos.
Marciano foi um dos beneficiados com o pagamento da mensalidade para poder estudar. Os irmãos dele também receberam kits escolares, o que foi uma alegria por algo que para os brasileiros é básico, mas para eles, um presente necessário. “Nosso povo está muito cansado. De maneira particular, sou de família pobre, se puderem me ajudar, me ajudem. Obrigado”, ressaltou Marciano. O jovem ainda participou dos encontros de catequese e será batizado este ano.
O sub-diretor e presidente do Conselho Técnico-Pedagógico do Liceu, José Domingos Samu, destacou que o jovem é a força para qualquer sociedade. Mas, sem a educação significa que ele fica limitado e não consegue desenvolver a capacidade técnica e intelectual. “Os estudos vão servir como meio onde o jovem vai ter esta oportunidade de desenvolver propriamente a sua família, a sociedade e o país em geral”, enfatizou.
Atualmente são concedidas 270 bolsas para estudantes do Liceu. Em 2014 foram distribuídos um total de 650 kits de materiais escolares e beneficiadas 200 crianças e adolescentes na colônia de férias.
A educação se mostra como um instrumento modificador da consciência humana, forma o homem “e o transforma num ser produtivo. Aqui, muitas crianças não frequentam a escola e jovens vão até o quinto ano, porque não tem oportunidade de continuar. Não temos possibilidade de comprar material, tudo é caro. Por isso mesmo queremos solicitar apoio de diferentes entidades no Brasil que venham conosco para esta escola. Qualquer ajuda que seja concedida, vamos louvar momento a momento”, emocionou-se o diretor do colégio, Mário Moba Mura.
Padre Vilson explica que a cooperação internacional nasce por uma questão de solidariedade entre os povos. “Não ser outro colonizador. Quando a gente traz o Pe. Maio para cá e discute com ele as questões dele, as nossas, a gente tem um ponto em comum que é a criança e o jovem frente à realidade do futuro desta criançada”, enfatizou o padre da Arquidiocese.
Padre Maio da Silva disse que ajudar essas crianças com um caderno, uma caneta, lápis ou uma borracha, é apoiar na construção do sonho delas, ajudar a construir a Guiné-Bissau, em particular, a Vila de Empada. “O meu desejo agora é que Deus nos ajude a conseguir pelo menos quatro salas. Quando cai a chuva não tenho onde colocar estas crianças, a não ser as varandas das casas. Do fundo do meu coração agradeço todo povo brasileiro, que de coração humilde e simples contribuíram para a educação dessas crianças. Mesmo não tendo nada, mas temos algo a dar a vocês, que são as nossas orações”.
Crianças atendidas em 2015
O projeto da rede de educação para a África apoiado pelo Instituto Vilson Groh é para dez anos. Tem como slogan: “Com um pão, um lápis, um caderno e um professor é possível construir o sonho de uma criança em Guiné Bissau”.
Mantém apoio ao Liceu com as bolsas de ensino, com kits de materiais escolares e ajuda à colônia de férias, mas no Colégio Liceu foi ampliado para a questão da alimentação. A comunidade local constrói a cantina e contrata o cozinheiro, já o Instituto e seus apoiadores no Brasil ajudam com o fornecimento do alimento. Comida simples, mas da condição deles estudarem o período da escola e suportarem a longa caminhada.
Nesta ampliação foram adotadas outras três escolas com materiais pedagógicos e alimentação. Com isso, serão 1.300 crianças e adolescentes atendidos pelo Instituto.
O dinheiro está sendo aplicado por um gestor local, guineense, que conhece a realidade local, sabe quem pode pagar um pouco ou nada da mensalidade.
Curiosidades de Guiné Bissau
É um país muito instável. A cultura na região de Empada é principalmente da castanha de caju. A alimentação é o arroz.
O ensino superior é muito fraco. Pouquíssimas opções de faculdade e cursos técnicos no país inteiro. Mas há um olhar de família bastante enraizado. A questão solidária é grande, um ajuda o outro.
Crioulo, português e as línguas tradicionais são as mais faladas. Quem consegue chegar à faculdade, estuda outros idiomas.
A polícia não anda armada, em geral, há certa tranquilidade naquela região da África. O país é grande e de difícil acesso. Na época da chuva, dificulta ainda mais a passagem.
A maioria da população é muçulmana, mas reconhecem o apoio da Igreja Católica. Há um percentual pequeno de cristãos. O Padre da Arquidiocese, Lúcio Espíndola, está há oito anos em missão naquele país. Ele e missionários da Comunidade Católica Divino Oleiro desenvolvem trabalhos de evangelização e na parte social para os africanos da Diocese de Bafatá, Guiné Bissau.
Modelo econômico para nova etapa 2015/2 a 2016/1
Investimento anual: R$ 104.000,00
Solução: 350 doadores X R$ 300,00/ano = R$ 105.000,00/ano
Doações
Banco do Brasil: Ag. 4236-6 / CC 57543-7
CNPJ: 13.188.828/0001-67
Contato: (48) 3039-1828
Matéria de capa da edição de julho de 2015 do Jornal da Arquidiocese de Florianópolis, páginas 06 e 07.